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(D)eforma Tributária: Promessas e Realidades

Milena Bastos

O assunto mais comentado dos últimos meses, e com certeza dos próximos também, é a tal da “Reforma Tributária”, que carinhosamente decidimos apelidar de Deforma Tributária, votada no início de julho (07/07/2023). A Deforma Tributária teve sua proposta aprovada em segundo turno na Câmara dos Deputados e o placar registrou 375 votos a favor, 113 contrários e 3 abstenções para o texto da PEC nº 45/2019.


Apesar de aprovada na Câmara dos Deputados em dois turnos, a proposta de Deforma Tributária seguirá para o Senado Federal, onde acontecerá uma nova votação, e, após os trâmites legais, a Deforma poderá ser transformada em Emenda Constitucional ou retornar para a Câmara dos Deputados para ser votada novamente (no caso de modificação substancial em seu texto).


Agora você deve estar se perguntando, mas por que estamos chamando a tal da “Reforma Tributária” de Deforma Tributária, não é mesmo? Ah, motivos não faltam...


Todo o marketing envolvendo a Deforma foi pautado em slogans como simplificação, desoneração da carga tributária, redução de desigualdades, fim da guerra fiscal, dentre outros termos sedutores para se utilizar no segundo país que mais tributa empresas no mundo.


Afinal, quem seria contrário a esses termos? Alguém por aí é contra algum destes ideais que normalmente estão atrelados ao avanço e ao desenvolvimento? Tenho certeza que não! E é justamente neste ponto que a Deforma começa. 


Um bom marketing desenhado para ser impossível de você ser contra a ideia proposta. Mas afinal, que ideia é esta? Se fala em tantas propostas “inovadoras”, que vão revolucionar o sistema tributário brasileiro e solucionar todos os seus problemas de uma só vez. O que está no texto que foi aprovado pelos Deputados às pressas numa madrugada de sexta-feira do dia 07/07/2023? Será que eles mesmo saberiam nos dizer?


Tentando esclarecer a Deforma que está sendo proposta como solução para todos os nossos problemas (à lá “Organizações Tabajara”), a ROIT vem explicar o que, de fato, diz o texto da PEC 45/2019, nos termos em que votada. Porque, no final das contas, o que vale para defesa dos direitos dos Contribuintes é o texto de lei, e não os slogans marketeiros. 


Vamos começar pela tal da simplificação. Unificação de impostos e leis, para que o Contribuinte não tenha dúvidas quanto à aplicação da norma tributária. Só que não. 


A iniciar pelos tributos, de cinco incidentes sobre o consumo, passaremos a ter três: o ICMS e o ISS se transformam em um único Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), o PIS e a COFINS serão unificados na Contribuição Social sobre Bens e Serviços (CBS) e o IPI será extinto e “em seu lugar” (entre muitas aspas) entrará o Imposto Seletivo (IS). No entanto, isso nem de perto simplifica o nosso sistema tributário, porque ainda existem diversos tributos relevantes, como o IOF, a CIDE, CPRB, IRPJ, CSLL, dentre outros, inclusive aqueles incidentes sobre a folha, como o INSS e Outras Entidades, que sequer foram alvo da reforma e são os que mais influenciam na geração de empregos no país. 


Quanto ao aspecto unificação da lei tributária, a piada já vem pronta. O texto da PEC 45/2019, nos termos em que aprovada, faz 58 menções à Lei Complementar. Isso significa dizer que pelo menos cinquenta e oito vezes a proposta de reforma está deixando a cargo de uma legislação que sequer existe (ou apresenta um texto prévio para análise) definir temas relevantes como instituição dos tributos, hipóteses de incidência, alíquotas e essas definições que pouco importam para implementação de uma reforma tributária séria e eficaz. Na verdade, o slogan da Deforma deveria ser insegurança jurídica, incertezas e armadilhas.


Isso sem falar nos diversos termos que abrem brechas interpretativas no decorrer do texto da Emenda Constitucional proposta. Ou seja, ao invés de simplificar, utilizando-se dos pelo menos 25 anos de jurisprudência já consolidada dos Tribunais Superiores acerca de termos tributários, passamos a interpretar tudo do absoluto zero


Já pensou que teremos novas discussões a respeito do IBS e da CBS (e das demais alterações) que poderão levar mais de dez anos para serem solucionadas pelo STF e pelo STJ, como foi o caso do conceito da receita bruta para fins de inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS (“tese do século”) e o conceito de insumo para crédito de PIS e COFINS? Isso tudo custa muito dinheiro e quem irá bancar a conta, como sempre, seremos nós, Contribuintes!


E há quem diga que estamos sendo sarcásticos ao chamar a tal da “Reforma” de Deforma...


Com a aprovação da Deforma Tributária, nos termos em que encaminhada para o Senado, a base tributária irá aumentar. Produtos que hoje não são tributados pelo ICMS ou pelo ISS passarão a ser tributados pelo IBS, tais como: locação de bens móveis e imóveis, serviços de streamings e toda a operação que envolva o consumo e cessões de direitos.


Além da ampliação da base de incidência da tributação, o aumento da carga tributária não para por aí! Ela se dará por diversas outras razões, uma delas é o ITCMD que passará a ter uma alíquota obrigatoriamente progressiva e o IPVA que também passará a contar com a progressividade de alíquota. 


Ainda contaremos com a criação do Imposto Seletivo, que passará a tributar tudo que o Estado (latu sensu) considerar “prejudicial à saúde”, poderá ter suas alíquotas alteradas por simples Decreto do Poder Executivo (e não por Lei Complementar), podendo compor a base de cálculo do IBS, CBS, ICMS e ISS – estes últimos durante o período de transição – além da possibilidade de ter a mesma base de cálculo de outros tributos. 


Neste ponto é importante ressaltar que dizer que a alteração pode ser dada via Decreto é o mesmo que dizer que ela pode ocorrer via Medida Provisória, que apesar de ser um instituto criado para situações emergenciais, sabemos que, na prática, sua utilização acaba sendo mitigada. Portanto, do dia para a noite, podemos ter novas alíquotas para tributos que influenciam diretamente nas operações das empresas, determinando, inclusive, a lucratividade destas, de forma a extirpar qualquer sinal de segurança jurídica que ainda temos, desincentivando ainda mais a atividade empresarial no país.


Ou seja, o novo Imposto Seletivo – assim como toda esta Deforma – vai contra todos os princípios basilares do Direito Tributário. Isso que chamamos de inovação! Inovação invertida e pró-fisco, contrária às garantias fundamentais dos Contribuintes! Viva ao progresso da Deforma!


Além do Imposto Seletivo, outros tributos poderão ser atualizados por Decreto, podendo majorar a carga tributária sem necessidade de aprovação pelo Poder Legislativo, bastando um ato unilateral do Poder Executivo. São eles: Imposto sobre a Importação e Exportação, o IPTU, o IPI (enquanto vigente) e o Imposto Cambial. Acho que já tá ficando claro o maior beneficiário dessa história toda, não é mesmo?


Para deixar ainda mais simples a nossa Deforma Tributária, o IBS é um prato cheio para substituir o ICMS e o ISS, afinal, este diminuirá a guerra fiscal entre os Estados, acabando com os benefícios fiscais e simplificando as normas tributárias esparsas em nosso sistema, não é mesmo? Risos. 


Senão vejamos, as alíquotas do referido imposto ainda são desconhecidas, e, mesmo se aprovada a Deforma, serão variáveis, determinada por cada Estado/Município da Federação por Lei específica. Quando o Estado ou Município não tiver promulgado sua lei, a alíquota padrão será definida pelo Senado. Isso porque a tal da “alíquota única” de IBS será válida somente para o período de transição, enquanto os Estados e os Municípios ainda estiverem cobrando o ICMS e o ISS, respectivamente. Após o período de transição, as alíquotas de IBS passarão a ser definidas pelos critérios de cada Estado e de cada Município. 


E como isso fica na prática? Hipoteticamente, caso a alíquota nacional padrão for definida em um patamar de 25% (nenhum valor está definido no texto), cerca de 9% deste tributo será destinado para a União, 14% será destinado para o Estado onde o imposto é cobrado e 2% será destinado ao município onde a operação está sendo realizada. Caso o Estado do Paraná decida que não quer um percentual de 14%, mas sim de 19%, o contribuinte estabelecido no Estado do Paraná passará a pagar o IBS na alíquota de 30%, para equilibrar com a alíquota do Estado do Paraná. Ou seja, o caos continuará instaurado, porque cada Estado e cada Município continua autorizado a criar suas próprias alíquotas, majorando a carga tributária de acordo com a localização do Contribuinte.


E aí nos perguntamos: onde está a simplificação? Ainda teremos complexidade, exceções e regras distintas. Sem falar em uma bem provável Guerra Fiscal invertida, uma vez que ao invés de as empresas buscarem o melhor local para instalar suas operações, os Consumidores passarão a buscar o melhor local para viver.


Já em relação aos benefícios fiscais de ICMS, estes vão ser extintos assim que aprovada a Deforma, e antes mesmo do fim da cobrança do próprio ICMS, que ocorrerá somente em 2032. É que conforme dito anteriormente, a ideia do novo sistema tributário proposto é deslocar a cobrança do tributo na “origem” para o “destino”, acabando com a lógica dos Estados atraírem investimentos através de concessões de incentivos tributários.


E o saldo credor de ICMS dos contribuintes? Como vai ficar caso a Deforma seja aprovada? O saldo destes créditos deverá ser informado pelos Estados e Distrito Federal ao Conselho Federativo do IBS para que seja compensado pelo prazo remanescente, no caso de créditos de ativo permanente, e, em 240 meses para os demais casos, nos termos da Lei Complementar (ainda não editada), em uma espécie de “meu ICMS, minha vida”.


Em razão da Lei Complementar ainda não ter proposta de redação, nem especulações, este ponto ainda é nebuloso na Deforma, o que vai gerar dificuldade para as empresas planejarem o recebimento dos créditos que têm direito. O final dessa história nós já conhecemos e provavelmente acabará com os Contribuintes precisando recorrer ao Poder Judiciário (redução da litigiosidade, não é mesmo? kkkk).


Sobre os créditos remanescentes de PIS, COFINS e IPI, não há previsão sobre como se dará a compensação ou restituição destes, nem sequer uma menção a ser definida em Lei Complementar. 

Como visto, os benefícios fiscais serão extintos, mas depende, porque existirão “benefícios regionais” e o texto ainda prevê hipóteses de não incidência, imunidade, regimes específicos, diferenciados ou favorecidos. Ou seja, a Deforma não vai simplificar tanto quanto promete.


Além disso, a proposta de Deforma, nos termos em que enviada para o Senado, fere o princípio constitucional do Pacto Federativo, o qual garante a igualdade, autonomia e independência dos Entes Federados, uma vez que aumenta a competência tributária da União, reduzindo, consequentemente, a dos Estados e Municípios. 


Apesar de se falar na distribuição dos recursos arrecadados, a simples distribuição não garante a autoadministração dos Entes, uma vez que esta exige competência tributária própria para instituir tributos, regulá-los, e, inclusive, conceder benefícios fiscais sobre eles, conforme falamos anteriormente. Ou seja, no contexto em que posta a Deforma, os Entes Federados (leia-se: Estados e Municípios) vão perder sua capacidade de autogerenciamento, uma vez que não poderão gerir as receitas tributárias, já que extirpada suas competências do texto constitucional, ficando à mercê das decisões tomadas pela União nesta seara.


Todo o exposto corrobora ainda mais o fato desta Proposta de Emenda Constitucional ser consubstanciada em inconstitucionalidades, e, caso assim não o fosse ou se o objetivo final não fosse aumentar a arrecadação, onerando a cadeia produtiva e o consumidor final, o governo não precisaria ter investido quase 8 bilhões de reais em “empurrões” para os deputados aprovassem o texto da PEC 45/2019 na calada da noite.


Além disso, as manchetes a favor desta Deforma sempre disseram frases como “não-cumulatividade plena, sem distorções como ocorre no ICMS, para desonerar a cadeia produtiva e tornar o imposto mais transparente”. Ocorre que não é isso que está apresentado no texto da PEC 45/2019.


Como mencionamos, o que assegura o Contribuinte é o texto constitucional e não manchetes de jornais ou sites de notícias. Todas as nuances aplicadas ao IBS e à CBS se assemelham mais do que deveriam ao atual ICMS, com todos os mecanismos prontos para criação de conflito entre Contribuintes e Fisco, alterando somente a majoração da carga tributária. A história da diminuição da lide tributária administrativa e judicial cai por terra.


Se aprovada nos termos em que se encontra, a Deforma Tributária não apresentará uma não cumulatividade plena, existindo previsão de exceções ao crédito de IBS e CBS. Sem falar que existe a mesma brecha que causou o caos na não-cumulatividade do ICMS: o imposto será não cumulativo nos termos “a ser definido em Lei Complementar”.


Somado a isso, a substituição tributária continua sendo permitida pela Deforma, mesmo após a instituição do IBS e da CBS, uma vez que a norma do art. 150, §7º, que assim autoriza tal mecanismo (principal problema do ICMS) continuará vigente no sistema.


Ou seja, todo esse alvoroço que está acontecendo ao redor do IBS e da CBS é um prato cheio para que se torne tudo mais do mesmo, com todas as restrições ao crédito (ou cashback, como preferirem chamar), tornando-os cumulativos no início da cadeia produtiva, onerando excessivamente os adquirentes, que terão que trabalhar com maior capital de giro. 


Com tudo isso, o agronegócio será um dos setores mais afetados, subindo diretamente o preço do alimento para o consumidor final, apesar da “alíquota zero da cesta básica” que hoje já é realidade na maioria absoluta, para não dizer na totalidade, do território nacional. É que todos os benefícios fiscais das etapas de produção anteriores à chegada dos produtos no consumidor final serão extirpados do sistema, deixando a operação significativamente mais onerosa, o que consequentemente aumentará o preço final do produto, independentemente da alíquota zero na etapa final. Isso sem falar na discussão que vai ser gerada acerca do Imposto Seletivo, defensivos agrícolas e o suposto “impacto ao meio ambiente” ...


Seguindo o agronegócio, o setor de serviços também será um grande afetado por esta Deforma que está sendo apreciada. Isso porque ao invés de recolher alíquotas de ISS que variavam entre 2 e 5%, se o texto for aprovado, passarão a recolher o IBS com valores desconhecidos, mas com patamares muito superiores. 


Além destes setores, o sistema tributário como um todo será afetado negativamente. Isso porque a Deforma proposta é defeituosa e mais amplia os problemas tributários do país do que soluciona problemas. A saída proposta pela PEC 45/2019 é onerar os Contribuintes, mascarando o aumento da carga tributária como uma revolução simplificadora cheia de contrapartidas e cashbacks, que, na prática, sabemos que serão créditos quase impossíveis de serem recuperados, seja por falta de sistema, seja por falta de expertise tributária do próprio contribuinte, já que o sistema não vai ser simplificado!!


Além da problemática dos créditos que não terão estorno, nada se falou sobre os créditos de IBS e CBS sobre a folha de pagamentos. O INSS é o tributo que mais impacta no fator contratação e geração de emprego no país e ficou de fora da tal reforma tributária revolucionária. Como acreditar em uma reforma que não aborda um tema tão importante para o desenvolvimento? Ou, pior, ignora completamente princípios basilares que dão segurança ao empresário (e ao investidor estrangeiro) para desenvolver atividades econômicas no país?


Isso tudo sem falar no prazo de transição estabelecido: para os contribuintes será de 8 anos e para os Entes Federados o prazo será de 50 anos. 


O período de transição na nossa singela opinião é a parte mais cômica e que deixa ainda mais em evidência tudo que pode dar errado nesta Deforma. Em primeiro lugar porque se estabeleceu que em 2026 se cobrará uma alíquota de 0,1% de IBS e 0,9% de CBS, em uma espécie de test drive com o Contribuinte, a fim do próprio governo poder entender o quanto cobrar destes novos tributos (enquanto não deixa de arrecadar com o ICMS, ISS, PIS e COFINS). 


Tudo isso, no mínimo, nos demonstra que nem mesmo foi realizado um estudo de viabilidade econômica para a Deforma proposta, que sequer tem alíquotas pré-definidas ou um plano bem estruturado, pronto para dar certo.


Outro ponto, não menos importante, é o caos que esse período de transição vai causar, tanto para as empresas, quanto para os consumidores. O que era para simplificar, está vindo para complicar, e muito mais! Além de cumprir as leis antigas, o contribuinte precisa estar ciente das novas legislações, que, como vimos, não serão poucas, além de estar atento aos prazos, requisitos e obrigações acessórias para a transição. Tudo isso em um curto período de oito anos :)


De tudo que expomos até agora concluímos que quando a Deforma for definitivamente efetivada, já precisaremos de uma nova reforma, pois já terão visto todos os seus problemas. Enquanto isso, nós, Contribuintes, seguiremos de marionetes (para não falar ratos de laboratório), sendo obrigados a nos sujeitarmos a todas essas nuances com cada vez menos prerrogativas.


De toda forma, aprovada ou não esta Deforma, a ROIT está aqui para te auxiliar nesse período de incertezas que virá. 


Ficou com dúvida? Clique aqui e fale com um especialista.



28 de janeiro de 2025
O Supremo Tribunal Federal (STF) voltou ao julgamento que afastou a incidência do ICMS nas transferências interestaduais de mercadorias entre estabelecimentos de uma mesma empresa. Mesmo com a modulação da decisão, a questão, segundo os contribuintes, não ficou completamente definida. Empresas acabaram autuadas por não pagamento do imposto. O tema está na pauta dos tribunais superiores há mais de 30 anos. O primeiro precedente qualificado sobre o tema é de 1996: a Súmula nº 166 do Superior Tribunal de Justiça (STJ). O texto diz que “não constitui fato gerador do ICMS o simples deslocamento de mercadoria de um para outro estabelecimento do mesmo contribuinte”. Em 2021, o Supremo julgou o assunto com repercussão geral, no Tema 1099. Foi decidido que a cobrança era inconstitucional, mas a decisão foi modulada para só ter eficácia para o exercício financeiro de 2024, exceto para os processos administrativos e judiciais pendentes de julgamento “até a data de publicação da ata de julgamento da decisão de mérito da ADC 49”, que foi dia 29 de abril de 2021. O problema é que alguns Estados começaram a lavrar autos de infração para os exercícios financeiros entre a data de publicação da ata e o início da vigência da decisão – ou seja, de maio de 2021 até dezembro de 2023. Porém, para tributaristas, não faz sentido cobrar um imposto que foi declarado inconstitucional em razão da modulação de efeitos. Os contribuintes já tinham tentado restringir a cobrança em embargos de declaração na ADC 49. Mas eles foram rejeitados duas vezes porque tinham sido apresentados por amici curiae (interessados no processo, e não as partes). Agora, a questão voltou à Corte na forma de recurso extraordinário, e já há maioria no Plenário para reconhecer que ela tem repercussão geral e para reafirmar a modulação nos termos em que foi formulada em 2023 (RE 1490708). Segundo Monique Salgado, Head of Legal da ROIT, empresa que usa inteligência artificial para soluções tributárias, e advogada da causa que chegou ao Supremo, os desembargadores do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) tiveram posicionamento pró-contribuinte, mas a Procuradoria-Geral do Estado (PGE) recorreu para tentar chancelar a cobrança retroativa. “Se o Estado puder cobrar esse ICMS, vai virar uma caça às bruxas contra os contribuintes. A modulação de efeitos serve para garantir a segurança jurídica, e não para dar carta branca para os Estados cobrarem um imposto que foi considerado inconstitucional”, diz. Apesar de o entendimento do TJSP no caso ser pró-contribuinte, outros tribunais têm dado razão ao Fisco. Em março de 2024, a 21ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) negou o pedido de uma empresa para não pagar o imposto porque o processo “não se enquadra na exceção estabelecida [na modulação], considerando que impetrado apenas em 30 de março de 2023”. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) também deu razão ao Fisco quanto à data de validade do precedente do Supremo, e reformou a sentença favorável que o contribuinte tinha conseguido na primeira instância (processo nº 1.0000.24.155972-3/001). Até o fechamento da edição, havia sete votos pela manutenção do entendimento atual. Ainda há a possibilidade de algum ministro pedir destaque e levar o julgamento para o plenário físico. Se prevalecer o entendimento atual, ficará mantida a situação que abriu a brecha para a cobrança do imposto pelos Estados, segundo Bruno Teixeira, sócio tributarista de TozziniFreire Advogados. No voto condutor do julgamento, o relator do processo, ministro Luís Roberto Barroso, apontou que a “desconsideração da modulação, além de violar a autoridade das decisões do STF em jurisdição constitucional, contraria a segurança jurídica e o equilíbrio fiscal que justificaram a modulação”. Para os representantes dos contribuintes, no entanto, o imposto não pode ser exigido. “Eu até diria que, no julgamento da ADC 49, ficou muito claro que não poderia cobrar. Inclusive, em seu voto, o ministro Nunes Marques fez a ressalva explícita de que eventual modulação não autorizava a Fazenda a autuar os contribuintes”, diz Teixeira. A situação dos contribuintes é duplamente negativa, aponta o especialista: por um lado, não pode reivindicar o tributo que eventualmente tenha sido pago antes da declaração de inconstitucionalidade e, por outro, está sujeito à cobrança retroativa dos tributos em relação a exercícios financeiros passados. Leonardo Roesler, especialista em direito tributário do RCA Advogados, aponta que as empresas que não judicializaram a questão estão sendo obrigadas a pagar um imposto declarado inconstitucional. “A solução justa deveria ser permitir que as empresas compensem o imposto pago indevidamente.” A manutenção da tese fragiliza as empresas que escolheram não judicializar uma questão que já parecia pacificada no Judiciário há muitos anos, afirma Mariana Ferreira, coordenadora tributária no Murayama Affonso Ferreira e Mota Advogados. “Esse julgamento evidencia que a segurança jurídica na esfera tributária é muito frágil, o que leva à infeliz necessidade de os contribuintes precisarem judicializar causas pelas quais, em regra, eles não precisariam brigar”, diz a advogada. “Estamos falando de três anos de recolhimento, é um impacto muito significativo no caixa das empresas.” Procurada pelo Valor, a Procuradoria-Geral do Estado de São Paulo (PGR-SP) não se manifestou. Fonte: Valor Econômico , 28 de janeiro de 2025

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Agora, a questão voltou à Corte na forma de recurso extraordinário, e já há maioria no Plenário para reconhecer que ela tem repercussão geral e para reafirmar a modulação nos termos em que foi formulada em 2023 (RE 1490708). Segundo Monique Salgado, Head of Legal da ROIT, empresa que usa inteligência artificial para soluções tributárias, e advogada da causa que chegou ao Supremo, os desembargadores do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) tiveram posicionamento pró-contribuinte, mas a Procuradoria-Geral do Estado (PGE) recorreu para tentar chancelar a cobrança retroativa. “Se o Estado puder cobrar esse ICMS, vai virar uma caça às bruxas contra os contribuintes. A modulação de efeitos serve para garantir a segurança jurídica, e não para dar carta branca para os Estados cobrarem um imposto que foi considerado inconstitucional”, diz. Apesar de o entendimento do TJSP no caso ser pró-contribuinte, outros tribunais têm dado razão ao Fisco. Em março de 2024, a 21ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) negou o pedido de uma empresa para não pagar o imposto porque o processo “não se enquadra na exceção estabelecida [na modulação], considerando que impetrado apenas em 30 de março de 2023”. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) também deu razão ao Fisco quanto à data de validade do precedente do Supremo, e reformou a sentença favorável que o contribuinte tinha conseguido na primeira instância (processo nº 1.0000.24.155972-3/001). Até o fechamento da edição, havia sete votos pela manutenção do entendimento atual. Ainda há a possibilidade de algum ministro pedir destaque e levar o julgamento para o plenário físico. Se prevalecer o entendimento atual, ficará mantida a situação que abriu a brecha para a cobrança do imposto pelos Estados, segundo Bruno Teixeira, sócio tributarista de TozziniFreire Advogados. No voto condutor do julgamento, o relator do processo, ministro Luís Roberto Barroso, apontou que a “desconsideração da modulação, além de violar a autoridade das decisões do STF em jurisdição constitucional, contraria a segurança jurídica e o equilíbrio fiscal que justificaram a modulação”. Para os representantes dos contribuintes, no entanto, o imposto não pode ser exigido. “Eu até diria que, no julgamento da ADC 49, ficou muito claro que não poderia cobrar. Inclusive, em seu voto, o ministro Nunes Marques fez a ressalva explícita de que eventual modulação não autorizava a Fazenda a autuar os contribuintes”, diz Teixeira. A situação dos contribuintes é duplamente negativa, aponta o especialista: por um lado, não pode reivindicar o tributo que eventualmente tenha sido pago antes da declaração de inconstitucionalidade e, por outro, está sujeito à cobrança retroativa dos tributos em relação a exercícios financeiros passados. 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14 de janeiro de 2025
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